Eu, Nerd.

Senhoras e senhores, é um prazer estrear este bloco amontoado de grafismos e signos visuais que costumam chamar de texto. E para a estreia, gostaria de discutir um tema que há muito tempo me dá certas coceiras, como quando a caspa ataca e você nem sabe direito o porquê.

Afinal, o que raios é ser nerd? O nerd, enquanto substantivo, passou por uma longa jornada de aceitação adjetiva, saindo do campo da ofensa objetiva para o adjetivo subjetivo. Um pouco dessa jornada todos conhecemos, ainda mais para quem, creio eu, é o público desse site. De indivíduo sócio-fóbico e estudioso, cheio de espinhas e com tremendo medo do sexo oposto ao hipster judeu criador de algoritmos e empresas de sucesso. Que mudança não? A aceitação do nerd está intimamente ligada a ascensão e onipresença da tecnologia e entretenimento nas nossas vidas, principalmente quando dois seres deste grupo fundaram o que hoje é uma das empresas mais valiosas da galáxia – o Google. De nomes como J.J Abrams, Steven Spielbierg, Mark Zuckerberg, James Cameron a instituições poderosas como a Marvel e Disney e à entrada dos quadrinhos no cinema blockbuster. É difícil encontrar o ponto de mutação, quando entramos no lado negro, quando Deckard dá o sinal claro que é um androide. E claro, temos hoje a ramificação, o geek, já muito discutido e que não é o tema de hoje.

A própria origem da palavra é incerta e duvidosa, quase como um feitiço do Harry Potter. A lenda mais provável é que o nome surgiu em um livro do Dr. Seuss (o mano do Grinch) e daí se espalhou para os Estados Unidos e em algum momento passou a definir o indivíduo descrito acima.

Voltemos às origens (brasileiras pelo menos). Nerd era, lá nos anos oitenta, creio eu, acima de tudo uma pessoa estudiosa, inteligente e com hobbies e interesses que vistos do mainstream eram bizarros e infantis. Sim, claro, nessa estão quadrinhos, games, matemática, história oculta, ufologia, programação e computação. Parte da lenda, que virou mito, que virou história, também tinha a ver com as parcas habilidades sociais, feiura digna de um Morlock e uma possível virgindade eterna.

O nerd de hoje não é assim. Que bom não? Não sei.

Parte do que acredito ser mais admirável era sua capacidade de aprendizagem, de encontrar no conhecimento refúgio às intempéries da vida, de se realizar na ciência e na robótica podendo construir a mulher perfeita, ou de se afundar na fantasia e ficção científica para dar algum sentido à realidade. O nerd atual, enquanto rótulo, permite tudo. Gosta de pokemon? Nerd. Já leu alguns quadrinhos da Marvel? Nerd. Ah, Star Wars? Nerd. Em algumas profissões e círculos sociais, é um elogio, quase referência a uma classe elitista de pessoas inteligentes e diferenciadas. Em outras, provavelmente ainda não. Mas há um distanciamento da inteligência e do estudo. Descolou-se do antigo “cdf”. Já vi muita gente que foi/vai bem mal na escola e faculdade, com orgulho, mas enche o peito pra falar que é nerd porque assiste Big Bang Theory e entende 40% das piadas do Sheldon. Novos tempos. Nem piores nem melhores. Entendam que eu, em parte, pertenci a esse grupo. E também muitos dos “deuses” da tecnologia largaram a faculdade pra montar suas empresas, então não dá para ficar restrito ao gênero do aluno aplicado.

Por favor não entendam isso como um choro hipster de quem virou mainstream. Pelo contrário. É natural que tanto a palavra quanto o grupo que representa seja dinâmica, faz parte dos fluxos sociais e linguísticos, nunca é imutável. E sempre dá aquele arrepio ver a participação do Stephen Hawking no Big Bang Theory, os Vingadores serem a segunda maior bilheteria de todos os tempos e o Mario considerado patrimônio cultural da humanidade.

Então, afinal, que porra é ser um nerd hoje?

Discuti muito com amigos. Qual é o denominador comum? Ainda existe aquele senso de que é alguém que se aprofunda muito em determinado interesse, seja ele qual for. Existe o nerd musical. O nerd acadêmico. O nerd clássico dos quadrinhos. Mas existe o nerd de academia? A nerd de sapatos? No fim, chegamos a uma hipótese que vejo no comportamento da maioria das pessoas que se consideram nerds ou são rotuladas como tal.

O Nerd é insatisfeito, em algum nível, com a realidade. Não se sente completamente parte dela. É diferente da insatisfação reformadora de quem se considera parte dela. Muitos políticos e atores sociais tem a mesma insatisfação, mas partem pra militância e pra sua sua reforma. Ainda acreditam nela. Mas na minha leitura, o nerd não, e isso não necessariamente lhe tira a fome reformadora. A causa pode ser um trauma, uma ideologia, o que for, mas no fundo, ele não consegue sustentar parte da realidade. Ela lhe parece um deserto. Então ele recorre à fantasia, ficção científica, ficção e programação para criar e viver um sistema alternativo que seja mais inteligível e interessante. Que faça sentido e lhe provê aquilo que a realidade não pode. Não é apenas magia e aventura. É controle, poder e sentido. Ser um agente do mundo. Ser inteiramente parte dele.

Por isso não acho nem um pouco perturbador pensar que existem pessoas que se sintam mais confortáveis em World of Warcraft ou League of Legends. E isso é bom ou ruim? Não faço a menor ideia. Mas a realidade deve tanto àqueles que se sentem parte dela quanto àqueles que não.

E isto não é uma tentativa de erguer um muro social. Separar os “tru nerds” dos “noobs do omelete”. O mundo já tem muros demais, e sempre dói ver um grupo já oprimido no passado tentando criar outro. É apenas uma curiosidade. A busca pelo denominador comum, se é que ele existe. E se não existir, também não é problema. Mas se você gosta mesmo de criar muros, quem sabe Minecraft não seja a solução.

E pra você, o que é ser nerd?

Nerd: Novo Nerd

O projeto e a paixão de uma equipe de Nerds que gosta tanto de suas esquisitices que não consegue se conter. Afie sua espada, prepare seu golpe poderoso, pegue seus power converters e embarque nesta estrada, porque, meus amigos, “it´s gonna be Legen… wait for it… DARY! LEGENDARY!” - SO SAY WE ALL.

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